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Para a pesquisadora, o "armário televisivo" mascara e dificulta a representatividade LGBTQIA+

Foto do escritor: Bruna FrancoBruna Franco


Televisão com a bandeira LGBTQIA+ (Divulgação)

Ao estudar a representatividade LGBTQIA+ nos canais audiovisuais, a pesquisadora Juliana Ribeiro Pinto Bravo constatou a existência do que denominou como “armário televisivo”. Doutoranda em Artes, Cultura e Linguagens pela UFJF (Universidade Federal de Juiz de Fora) e mestre em Comunicação e bacharel em Cinema pela UFF (Universidade Federal Fluminense), ela explicou que o conceito que se origina na ideia deque existe um “armário” que condicionaria a representação de sujeitos LGBTQIA+ nas telenovelas das emissoras abertas do país, no caso da TV Globo.


– E este armário seria cheio de regras e normas que conduziriam a invisibilidade desses sujeitos e corpos nas telas. Atrelado a este conceito, estariam também as marcas e traços de violência simbólica que culminariam nos apagamentos desses personagens ora relegados aos clichês ora destinados ao fracasso ou a morte – contou a doutoranda.


Apesar das dificuldades, Juliana verificou não só o aumento quase exponencial de personagens LGBTQIA+ nas telenovelas, em um período de quase 15 anos, como também novas formas de abordagens e representações, novos contextos narrativos e motivações.


– É evidente que estas representações, muitas das vezes, foram fundamentadas em clichês ou representações dicotômicas, mas traziam ali uma representatividade nunca vista na TV aberta brasileira. Todo avanço obtido naquela época foi dinamizado por também retrocessos como boicotes, aumento dos discursos de ódio entre outros – disse Juliana.

Os canais audiovisuais são um dos principais meios de entretenimento, e atualmente tornou-se um grande aliado para novos conhecimentos e aprendizados. Cada vez mais é cobrado a representatividade nesses canais, seja para inclusão racial, seja para a sexualidade. Ver um casal gay ou lésbico tendo sua história contada para milhões de pessoas é extremamente importante e relevante, ainda mais dentro de todo um contexto patriarcal, religioso e retrógrado de anos.


Para o casal Amanda Simões Antunes, 31 anos, e Lívia Maria Narde de Souza, 37 anos, casadas há 2 anos e 5 meses, é extremamente importante falar sobre orientação sexual nos canais abertos, pois traz o conceito de normalidade quando se é passado na televisão, ainda mais em uma novela da TV globo.


– Eu quero beijo sem parecer clichê, quero de fato normalidade onde cabe normalidade e realmente repudio, onde cabe. Os canais audiovisuais são ferramentas que lideram massas, nesse critério eu vejo uma representatividade, agora na novela das 7 um estalinho, porque beijo de língua não é tão aceito, acho isso um retrocesso – contou Amanda.


O PRIMEIRO BEIJO GAY NA TV GLOBO

No ano de 2013 a Rede Globo exibia a novela Amor à Vida, escrita por Walcyr Carrasco. No último capítulo foi exibido o primeiro beijo gay na TV aberta, entre os personagens Félix e Nico, interpretados respectivamente pelos atores Mateus Solano e Thiago Fragoso. O beijo saiu após várias especulações, pois gerou muitas controvérsias, inclusive apelações nas redes sociais. A cena do beijo repercutiu fora do Brasil, o jornal Financial Times destacou na época: "Beijo gay em novela Amor à Vida é momento histórico para o Brasil".

Félix (Mateus Solano) e Niko (Thiago Fragoso) dão primeiro beijo gay na novela Amor à Vida, horário nobre da TV Globo (Divulgação)

Juliana fez uma análise na época das páginas criadas por fãs do personagem de Mateus Solano, o número de seguidores das primeiras semanas até o último capítulo teve um aumento expressivo.


– Para mim toda a repercussão que teve na época foi sintomática e derivada de alguns avanços sociais, políticos e econômicos que tínhamos conquistado até então: o reconhecimento da união civil entre homossexuais, o aumento do nome de representações políticas LGBTQIA+ nas instâncias federais e de partidos políticos, a permissão de uso do nome social em diversas ocasiões para pessoas trans e travestis, os avanços nas políticas públicas de saúde para a comunidade e, principalmente, tudo isto em consonância com o avanço da internet e das redes sociais – disse Juliana.


– Acredito que tal fato demonstre, não só, o poder das telenovelas e da TV aberta como elos sociais e de pertencimento para com a sociedade brasileira, como também a importância de ocupar espaços marcadamente heteronormativos nos meios audiovisuais, em especial, nos televisivos do horário nobre.


BBB21 QUEBRANDO BARREIRAS

O Big Brother Brasil é hoje um dos maiores reality shows da TV brasileira, e possui grande influência em nossa sociedade. É nítido que a sociedade não aceita 100% as diferenças, e quando isso é passado para os telespectadores, abre uma grande margem de público. Estar na televisão é saber que vai atingir milhões de pessoas, com diferentes etnias, linguagens e culturas.


Durante o BBB21 tivemos o primeiro beijo entre dois homens, Gilberto Nogueira e Lucas Penteado, aconteceu na festa da segunda semana de jogo. Para grande parte do público que assiste foi um momento revolucionário, assim como foi a opinião da Juliana.


– Aquele beijo representou uma resistência ao nosso panorama social e político, representou afeto, representou o amor e a dissidência. Aquele foi um beijo político. E quando televisionado e exibido transformou-se num símbolo dos novos tempos.


Primeiro beijo gay no Big Brother Brasil entre os participantes GIlberto e Lucas (Divulgação)

A OBJETIFICAÇÃO LÉSBICA

Por muitos anos as mulheres foram objetificadas nas indústrias pornográficas, sendo ela hétero, lésbica ou bissexual. A lesbofobia é uma combinação entre o machismo e homofobia, que dificulta a vida de mulheres que sentem atração por outras mulheres.


Um desses aspectos é a objetificação sexual, que trata as mulheres lésbicas e bissexuais como objetos e a serviço do prazer masculino. Essa visão da sexualidade lésbica como um fetiche tem consequências violentas: o assédio sexual e os estupros. Para a doutoranda isso é sintoma da sociedade machista-patriarcal-cis-heteronormativa-cristã.


– A escola reitera essa visão, quando delimita o que é “brincadeira de menino e o que é de menina”; a família reforça isso quando reitera o tradicionalismo das relações matrimoniais; a igreja reforça afetos dissidentes como pecado ou doença; a indústria do entretenimento ressalta a valorização da mulher como dona de casa etc. Então, ao meu ver, essa objetificação também está atrelada ao modo como nossa sociedade está fundamentada e os valores morais e éticos que se depreendem dela. A mídia reforça, como uma tática para discursos homogeneizantes e fácil de assimilação – contou.


Para o casal Amanda e Lívia, ainda é muito incomodo quando são abordadas na rua, em festas ou até mesmo em bares, e os homens ficarem excitados, fantasiar ou objetificar só pelo fato delas serem lésbicas.


– Tudo começa pela cultura machista que fomos introduzidos o tempo todo. Acho péssimo estarmos nesse lugar em pleno século XXI, a mudança é a colocação de cada mulher nesse processo de construção de uma nova sociedade. E sobre acreditar na mudança, faço no meu micro e tenho certeza de que isso vai mudar um macro, então eu vejo uma mudança sim – contou Lívia.


FAMÍLIA TRADICIONAL BRASILEIRA?

De alguns anos para cá esse termo surgiu e causou raiva em diversos brasileiros, pois restringir uma família apenas para um pai, uma mãe e filhos, é extremamente antigo e patriarcal.


A importância de trazer novos formatos de família para os meios audiovisuais são essenciais para essa aceitação. Não existe um padrão de família, família é amor. E todo mundo tem o direito de amar.


– Para mim, o que desejo é uma sociedade forte, altruísta, com pensamento crítico, que luta pelos mais vulneráveis, que apoia todo tipo de forma de amor. Então, deixo meu sopro de esperança para uma sociedade justa, democrática e de direitos fundamentais – disse Juliana.


– Vamos abrir nossa roda, está faltando tudo, educação, saúde, arte ... Muitas coisas mais. Para de se incomodar com quem o outro vai se casar, ou como vai explicar para seu filho quando ele olhar duas pessoas do mesmo sexo se beijando. Pelo amor né, acorda Brasil – disseram o casal.

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